domingo, 6 de novembro de 2011

Já era tarde. Passara o dia torcendo para as horas andarem mais rápido...aquele frio insuportável maltratava qualquer ser humano que não pudesse ficar em casa, debaixo das cobertas, tomando chocolate quente com conhaque.

O telefone tocou. Estranho ligarem àquela hora da noite. Mais estranho ainda o fato de ligarem em sua casa. Ultimamente só recebia ligações de operadoras de crédito ou de entidades beneficentes. Maldita solidão!

Do outro lado da linha, uma voz que não esperava ouvir. Emudeceu com a surpresa. Depois de uns minutos resolveu falar... nunca fora mal-educado, e não seria agora, depois de tudo que passaram.

Conversaram amenidades. “Como vai a vida? Família? Amigos? Trabalho? Seu cachorro ainda ronca enquanto dorme? Conseguiu fazer a viagem à Trancoso?”

Odiava essa intimidade forçada. Já não se conheciam mais, já não tinham afinidades. Por muito tempo não podiam ouvir o nome um do outro. Por que isso agora? Estava incomodado com a situação, mas sua educação sempre o freava frente a alguma situação em que pudesse ser rude. No fundo, se achava um frouxo, mas não conseguia mudar... era mais forte que ele.

- Me diga a real razão de me ligar a essas horas. Qualquer pessoa que tenha bom senso sabe que não faz parte dos bons costumes! – perguntou ele.

Ouviu um suspiro. Não soube decifrar se era de tristeza, de medo, de angústia. Logo depois, um silêncio ensurdecedor.

- Está me ouvindo?

- Sim – disse ela – Estou numa crise existencial.

- Outra?

- É. Preciso saber uma coisa e quero que seja sincero comigo...

- Sou todo ouvidos.

- Por que disse que me “amava pra sempre” e depois, sem mais nem menos, foi embora? Por que jogou fora todas as promessas e planos de um futuro juntos? Já tentei entender, procurei meus erros. Sei que nenhum foi tão grave assim. Por isso quero ouvir de você o que eu fiz de errado!

- Depois de tanto tempo?

- É, depois de tanto tempo! Afinal, se eu sou ou fui mesmo “o amor da sua vida”, tenho o direito de saber. Preciso saber! Preciso muito!

- Não foi culpa sua Ana. Não se martirize por isso! Você era perfeita!

- Então... ?
- Na verdade não é culpa de ninguém. Seres humanos são assim! Egoístas, hipócritas. Até o perfeito nos enjoa... não é uma exclusividade minha. Todos somos assim!

- Por que me enganou então?

- Porque tinha a necessidade de te fazer feliz, no início. Depois, quando a rotina e o comodismo chegaram, eu dizia da boca pra fora... não queria te magoar.

- Mas o fez!

- Fiz, e não me sinto orgulhoso disso. Você vai encontrar alguém novamente, alguém que te faça bem, que...

- Que me ame?

- O amor não existe. Não esse pelo qual você espera tanto. Eterno, imutável, incondicional.

- Não deveria ter te ligado. Você acaba com qualquer esperança de uma vida feliz e completa que resta em mim.

- Adeus Ana. Seja feliz!

Não ouviu resposta. Só o toque do telefone sendo desligado. Talvez tenha soado irônico.

Sentiu sono. Pessoas no geral despertavam nele a mais profunda preguiça. Virou para o lado e dormiu.

Nenhum comentário:

Postar um comentário